segunda-feira, 21 de março de 2011

MOÇAMBIQUE: PARCEIRO ESTRATÉGICO IMPORTANTE PARA PORTUGAL, EXEMPLO DE ESTABILIDADE POLITICA, DEMOCRÁTICA E DE DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO, CONSIDERA LUIS AMADO MINISTRO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS PORTUGUÊS

"Moçambique parceiro estratégico importante – afirma Ministro dos Negócios Estrangeiros português
DEPOIS de uma relação perturbada durante décadas pela questão de Cahora Bassa, Portugal está empenhado na criação de mecanismos de reforço da confiança com Moçambique.Maputo, Segunda-Feira, 21 de Março de 2011:: Notícias . O Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Luís Amado, que esteve semana passada em Maputo, acredita que, ultrapassado o dossier Cahora Bassa, um “quisto” que incomodou as relações bilaterais, Portugal e Moçambique estão empenhados com franqueza no aprofundamento do relacionamento. Nesse sentido, decidiram a realização de cimeiras anuais que o chefe da diplomacia portuguesa considera um passo histórico. Na entrevista ao “Notícias”, Luís Amado defende que ainda não chegou o momento de se embarcar no projecto de cidadão da CPLP, pois há muito por ter em conta: há grandes distorções e desequilíbrios que não ajudariam muito. Luís Amado atribui a Moçambique uma importância estratégica no contexto da região da África Austral e não só. Acha que Moçambique é uma plataforma muito importante para a projecção dos interesses portugueses na sua relação com as economias asiática e indiana e do Golfo Pérsico, que tem hoje uma palavra a dizer na economia mundial. O país enfrenta uma crise financeira de certa forma severa, que até se traduziu na retracção do investimento português no mundo, particularmente em Moçambique, mas há um esforço que está a ser feito em Lisboa para que isso não afecte os compromissos assumidos no contexto da cooperação bilateral. Em seguida apresentamos as partes mais incisivas da nossa conversa com o diplomata português. NOTÍCIAS (NOT) - Sr. ministro, Portugal continua a fazer parte do “Top 10” em termos de investimentos, mas baixou de posição a favor de outros. O que estará a acontecer, e qual será a razão disso? LUÍS AMADO (LA) - Não, Portugal continua a ser um dos principais investidores de Moçambique, mas é natural que face às dificuldades com que se debate a economia do nosso país, tenha havido alguma retracção no investimento fora de Portugal. Também nos últimos dois anos, em particular, dada a natureza da crise que hoje se vive em termos internacionais e em particular dos aspectos financeiros. Há dificuldades de financiamento que as nossas empresas também têm encontrado, mas no essencial, como sabe, Portugal é um dos principais investidores pelo menos dos investidores europeus em Moçambique, e as nossas empresas continuam muito empenhadas em aprofundar as suas relações com a economia de Moçambique. FLUIDEZ NA RELAÇÃO POLÍTICA E ECONÓMICA Maputo, Segunda-Feira, 21 de Março de 2011:: Notícias NOT - Pode apresentar em números esses investimentos em Moçambique?LA - Não tenho números exactos. O investimento é muito diferenciado, sector a sector, mas em várias áreas da actividade económica em Moçambique é significativo o volume de investimento que as empresas portuguesas têm feito nos últimos anos. Também no domínio da cooperação e da ajuda ao desenvolvimento os programas indicativos a cooperação têm tido um valor expressivo em alguns sectores. Mas no essencial, o que eu gostaria de sublinhar é que há uma excelente relação política entre o Estado moçambicano e o Estado português. Não há hoje contencioso nas nossas relações depois da resolução do problema de Cahora Bassa, que se arrastou durante décadas, há uma fluidez na relação política entre Moçambique e Portugal que muito favorece o ambiente de confiança com que as nossas empresas procuram investir e criar riqueza em Moçambique em praticamente todos os sectores.
NOT - No ano passado foi acordado o apoio programático ao Orçamento do Estado para o período 2010/2013. Portugal, como muitos países europeus e não só, está a enfrentar uma grave crise financeira. Até que ponto a situação não irá afectar os compromissos assumidos? LA - Eu tive a oportunidade de transmitir essa orientação do Governo português em relação à cooperação com o Governo de Moçambique. Especificamente no tocante à linha de apoio ao orçamento de Moçambique as instruções dadas foram no sentido de garantir que esse apoio será mantido. Faremos um esforço no sentido de  honrar esses compromissos, precisamente porque sabemos também a importância que esse apoio tem na estabilidade das nossas relações de cooperação e, apesar dos constrangimentos orçamentais que o nosso país conhece, esse apoio será garantido no próximo programa indicativo de cooperação. NOT - Portugal e Moçambique estabeleceram também no ano passado a realização de cimeiras anuais. O que é que está subjacente nesta iniciativa? LA - É a identificação clara por parte dos governos de Moçambique e de Portugal e uma dimensão estratégica própria nas relações entre os dois países. Portugal é um dos principais, senão o principal, parceiro europeu de Moçambique. E Moçambique é um dos principais parceiros de Portugal na África Austral e, por isso, nós temos toda a vantagem em intensificar o nosso diálogo político e as nosssas relações de forma a garantir que esse relacionamento estratégico entre os dois países e entre a União Europeia e a SADC possa ter expressão nessa relação. É por isso que durante a visita do Primeiro-Ministro a Moçambique no ano passado foi assumida a orientação de passar a ter cimeiras anuais dos governos dos dois países alternadamente em Lisboa e em Maputo para dar justamente expressão a essa densidade e essa dimensão de relacionamento entre Portugal e Moçambique no interesse dos dois países, agora que não há nenhum contencioso. Há uma grande oportunidade para os dois países consolidarem as suas relações no interesse de Portugal e no interesse de Moçambique. NOT - A reversão de Cahora Bassa, uma importante fonte de receitas para Portugal na altura, não terá sido mal entendida por alguns sectores portugueses? Agora, toda a sociedade portuguesa estará suficientemente esclarecida? LA: Não criou grande ressentimento. Sabe que eu era secretário de Estado da Cooperação quando essa questão de Cahora Bassa começou a ser negociada entre os dois governos ainda no início da década anterior? Era um tema permanente nas relações entre os nossos dois governos, era um “quisto” que pertubava as relações entre Portugal e Moçambique e creio que na generalidade dos actores políticos e dos agentes económicos em Portugal percebeu a importância de resolver este problema. E este problema foi resolvido de forma equilibrada, de forma negociada, satisfazendo os interessses dos dois países na base de um compromisso entre os dois estados e, por isso, mesmo que haja qualquer resíduo de ressentimento não tem nenhuma expressão política em Portugal. E como digo, da parte de Portugal hoje há uma relação tranquila com Moçambique, tão tranquila que permite que os governos tenham assumido esse passo histórico de passar a ter cimeiras anuais entre os dois governos.NOT - Sr. Ministro, o valor decorrente da reversão de Cahora Bassa terá já entrado todo nos cofres do Estado português?LA - São questões de caracter técnico que são acompanhadas pelos ministérios das Finanças e pelo Tesouro de Moçambique e de Portugal, mas sei que todo esse processo tem estado a decorrer com normalidade.NOT - Quer dizer que Moçambique ainda não concluiu o pagamento? LA - Não, não, não! Não estou a dizer isso, não tenho informação exacta sobre o desenvoilvimento desse dossier na sua vertente técnica, porque ela é acompanhada pelos ministérios das Finanças e não pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros.NOT - Previa-se que até finais do ano passado estivesse concluído o processo de alienação da participação portuguesa na HCB. Terá sido já concluído esse processo?LA - Está em curso um processo de diálogo e de negociação e eu acredito que na próxima cimeira, que será em Lisboa, essa será uma das questões da agenda do encontro, mas neste momento, tanto quanto sei, há uma negociação em curso entre o Governo português e o Governo de Moçambique sobre essa matéria. Agora há já uma posição da parte portuguesa que também está a ser preparada, mas, como disse, é uma negociação com alguma complexidade técnica, também num momento de algumas dificulidades que nós temos no plano finaceiro, mas não vejo nenhum problema para que esse processo seja concluído com a mesma tranquilidade com que a alienação de Cabora Bassa ocorreu.MOÇAMBIQUE PLATAFORMA DA PROJECÇÃO DE PORTUGAL
Maputo, Segunda-Feira, 21 de Março de 2011:: Notícias NOT - Qual será neste momento o principal interesse de Portugal em Moçambique? LA - Há muito interesse de fortalecer as relações com Moçambique por razões estratégicas, pela importância que Moçambique tem na África Austral, no Continente Africano e na relação desta região com regiões como a Ásia e o Pacífico, regiões que estão hoje a ter um peso dominante na economia mundial e uma dimensão geopolítica que não tinham até hoje. Portanto, para Portugal é muito importante ter com Moçambique uma relação estratégica como tem hoje, com uma forte vertente económica, com uma forte participação no processo de desenvolvimento da economia de Moçambique e a prazo com uma participação também de empresas moçambicanas que se hão-de consolidar a prazo na economia portuguesa. Portanto, uma interdependência crescente entre as nossas empresas e as empresas de Moçambique e com uma presença cada vez mais reforçada de Moçambique no espaço da Comunidade dos Países da Língua Portuguesa, no contexto de uma relação muito importante que Moçambique tem também com Angola e com peso muito particular na África Austral, porque a relação do eixo Luanda-Maputo com toda a África Austral está a mudar a própria natureza da África Austral e nessa perspectiva a relação que temos com Moçambique é importantíssima.
NOT - Que importância atribui a Moçambique no contexto da estratégia portuguesa para a região da África Austral? LA - Uma grande importância, porque Moçambique é hoje um exemplo de estabilidade política, democrática e de desenvolvimento económico na África Austral. É um país, como disse, de língua portuguesa que tem uma relação muito forte com Portugal, e Portugal tem relativamente a África Austral uma orientação estratégica de fazer desta região uma das regiões de prioridade para o futuro da nossa relação com a economia mundial e com sistema internacional, as ligações à África Austral são muito fortes. Temos aqui dois países de expressão portuguesa (Moçambique e Angola), uma importante comunidade portuguesa na Àfrica do Sul, as empressas portuguesas mais significativas de todos os sectores estão em Angola ou em Moçambique, a língua portuguesa é uma língua oficial da SADC, por isso, há aqui um potencial estratratégico muito importante. Moçambique tem, ainda além de tudo isso, uma economia muito aberta e uma sociedade muito aberta à relação com as sub-economias indiana e do Pacífico que, por isso, é uma economia que também, pelo seu dinamismo próprio e com o grande potencial de crescimento que tem revelado se vai constituir a prazo uma plataforma muito importante para a projecção dos interesses das empresas portuguesas na sua relação com a economia asiática e indiana, em particular, e do Golfo Pérsico. É por isso com grande sentido estratégico que nós olhamos para a relação com Moçambique e creio que muitas empresas olham para Moçambique também com esse sentido estratégico, de que não é só o interesse da economia e do mercado moçambicano, mas também as relações económicas e comerciais que a partir de Moçambique podem ser identificadas.
HÁ AINDA RETICÊNCIAS SOBRE A IDEIA DO CIDADÃO DA CPLP. Maputo, Segunda-Feira, 21 de Março de 2011:: Notícias .NOT - O que é estará a emperrar para que a ideia do cidadão lusófono se torne realidade? LA - Somos favoráveis a uma ideia de um cidadão da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Não tem que ter necessariamente o epíteto de cidadão lusófono, um cidadão do espaço da Comunidade dos Países da Língua Portuguesa, porque o espaço da Comunidade de Língua Portuguesa é um espaço de muitas línguas, com muitas culturas e de muitas identidades e neste sentido o conceito é muito redutor, por isso eu prefiro falar no conceito de um cidadão da Comunidade dos Países da Língua Portuguesa, e acredito que à medida que vão tendo lugar os processos de desenvolvimento e crescimento económico, à medida que vão se equilibrando as condições de vida e bem-estar das sociedades desse espaço, acredito também que a partilha de valores e de princípios que são comuns no âmbito da própria construção da comunidade, ano a ano, cimeira a cimeira, de encontro em encontro, é possível que a prazo nós possamos ter um quadro de valores de cidadania que sejam muito próximos, independentemente da distância das nossas sociedades de origem. É um trabalho que se vai continuar a desenvolver e que pressupõe uma aproximação nos ordenamentos jurídicos em muitos domínios em direitos, liberdade e garantias, direitos sociais, em direitos de circulação, tem que passar por uma crescente confiança e uma crescente inter-relação entre as nossas sociedades, as nossas economias, as nossas culturas. NOT - Parece haver receios por parte de Lisboa de que todos os caminhos possam dar a Portugal quando se estabelecer a livre circulação de pessoas no espaço da comunidade. Queira comentar esta percepção, Sr. ministro? LA - Sim, é obvio que essa situação de desequilíbrio sempre pesou em algumas posições que aqui e ali, este ou aquele Governo tomaram sobre essa matéria. Não ignoro isso, mas, como digo, há uma abertura para um princípio de evolução nesse sentido, creio que com o tempo se vai consagrar também. Devo dizer-lhe, como pode saber, que essa posição não é apenas da parte de Portugal, mas também de outros governos da CPLP. Eles entendem que esse momento também ainda não chegou, porque há grandes distorções, grandes diferenças, grandes desequilíbrios no conjunto. E, por isso, também outros estados que têm colocado algumas reticências nesse sentido. Mas, como diria, há essa perspectiva que a comunidade vai estruturar-se muito em torno de valores e princípios de cidadania comuns que vão imperar com o tempo na vida colectiva da comunidade. NOT - Como é que Portugal está a lidar com o debate sobre os contra e os prós do Acordo Ortográfico? LA - Acredito que haja alguns sectores - tenho a convicção de que há alguns sectores - designadamente no plano académico, que não aceitaram de ânimo leve a posição do Governo português sobre a implementação do Acordo Ortográfico. Mas creio que a sua implementação demonstrará que o impacto da entrada em vigor do acordo não é relevante do ponto de vista do fundamento desse debate, e por isso acredito que é necessário que, tal como em todos os acordos, também neste se empurrar à razão de todos os sectores da sociedade portuguesa que acompanham esta questão. No entanto, já está a ser implementado o acordo, e, como sabe, até hoje muitos órgãos de comunicação social, instituições assumiram a implementação desse acordo no tempo que começaram a fazer antes de ser implementado no Estado e na Administração Pública. NOT - Alguma opinião acredita que a admissão da Guiné-Equatorial, um país rico, como membro da CPLP, seria uma mais-valia para a comunidade e contribuiria para ter os seus dirigentes de perto e influenciá-los melhor para as reformas naquele país africano. O que pensa sobre o assunto?LA - A Cimeira de Luanda fez uma coisa que é comum nas organizações internacionais. Abriu um processo que acolheu ao pedido de adesão e abriu um processo de negociação tendo em vista a participação da Guiné-Equatorial no futuro à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Como sabes, há requisitos estatutários que exigem um trabalho prévio dos governos da Guiné-Equatorial para poder ser membro efectivo - uma vez que já é membro observador da CPLP. Mas no essencial acompanha o seu juízo de facto a Guiné-Equatorial preencher esses requisitos durante a fase de negociação da adesão que está em curso. A aproximação da Guiné-Equatorial aos valores e aos princípios em que a comunidade se funda será também importante para a reforma e para adaptação da Guiné-Equatorial às condições de vida política no espaço da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. É isto que está em causa. Mas, como disse, há um processo de adesão que se abriu na Cimeira de Luanda, veremos se até à Cimeira de Maputo o trabalho que a Guiné-Equatorial deve fazer para se preparar para ser membro de pleno direito da CPLP estará feito e depois os Estados decidirão – as decisões na CPLP são tomadas por unanimidade – e, portanto, é preciso que haja um compromisso de todos relativamente a esse objectivo. Não houve em Luanda uma rejeição liminar da integração da Guiné-Equatorial a prazo na CPLP. Depende do trabalho que for feito nos próximos anos para que a Guiné-Equatorial se adapte à matriz estatutária e princípios de valores da CPLP.NOT - Qual é a expectativa para a primeira cimeira Portugal-Moçambique?LA - Como disse, sendo a primeira depois da decisão tomada de termos cimeiras anuais, é passível de constituir o reforço da confiança entre os dois países, sabendo o que cada um tem que fazer, respeitando naturalmente as orientações e estratégias próprias que cada um dos países tem no reforço das suas capacidades económicas ao serviço do bem-estar dos nossos povos. É essa responsabilidade que qualquer Governo tem e acredito que quer o Governo de Moçambique quer o Governo de Portugal estão empenhados com franqueza no aprofundamento das suas relações.
Lázaro Manhiça" Fonte Jornal NOTICIAS.

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