"Défice de imagem de Portugal no exterior dificulta vendas. Notoriedade nas revistas da especialidade leva tempo a chegar a quem decide
Vinhos têm qualidade, mas os consumidores não sabem
Família Soares Franco, António ao centro
Steven Governo
16/02/2013 | 00:00 | Dinheiro Vivo
Longo foi o caminho de acesso dos vinhos portugueses ao reconhecimento internacional, mas, nos últimos anos, é crescente a sua presença nos rankings das revistas da especialidade. O que não significa que o consumidor, desconhecedor do mundo vitivinícola, já associe Portugal a sinónimo de bom vinho. Bem pelo contrário. Exportar está no ADN das empresas, mas todos apontam a falta de imagem de Portugal como sinónimo de qualidade como o grande obstáculo a ultrapassar. Como diz o diretor-geral da Niepoort, Portugal “ainda não está no radar do mundo dos vinhos internacionais”. Já chegou aos opinion leaders e aos sommeliers, mas falta chegar aos consumidores, os que decidem na hora de comprar.
E não se pense que esta é uma dificuldade reservada aos mais pequenos. A Sogrape, o maior grupo do setor, com 200 milhões de euros de faturação e 78 milhões de garrafas de produção anual, lembra que a quota dos vinhos portugueses nos principais mercados internacionais não chega a 1%. Claro que há casos particulares, como Brasil, Angola ou Moçambique, com quotas de 30% e até acima, mas que se prendem com a componente étnica. Júlio Martins, diretor comercial, admite que a qualidade percebida pelos consumidores tem vindo a melhorar, mas que “há um longo caminho a percorrer”.
A Sogrape exporta 70% da sua produção para 125 países, estando “muito centrada” na Europa e América do Norte, embora os seus drivers de crescimentos nos últimos ano venham da Europa de Leste, África, Ásia e América Latina. Embora representem só 20% das exportações, estes mercados têm crescido a dois dígitos, diz.
Com 180 anos de história e 18 milhões de faturação, a José Maria da Fonseca reconhece que os vinhos portugueses têm conquistado mais espaço e melhores críticas, mas que ainda não é o suficiente para Portugal conseguir assumir-se como categoria individual.
“Os vinhos portugueses eram muito negligenciados nas lojas, remetidos para a última prateleira a apanhar pó. Estão agora a subir no escalão de visibilidade, mas é preciso que os retalhistas convençam os consumidores a comprar, referindo que é uma excelente proposta na relação preço-qualidade”, diz António Soares Franco.
O empresário acredita que, com tempo, essa conquista se fará e defende que “precisamos que uma pessoa importante fale de Portugal, como a Oprah Winfrie falou da Austrália no seu programa”. Investimentos é coisa que não tem previsto, para além dos habituais. “Entre 1995 e 2000, investimentos mais de 30 milhões de euros, essencialmente em vinhas e adegas. As empresas médias, quando investem muito, têm de digerir esses investimentos. Estamos numa fase de consolidação e de redução de passivos bancários para nos prepararmos para o próximo salto”, defende.
A JMF vende mais de 10 milhões de garrafas ao ano, 80% das quais para mais de 40 países. Suécia, Brasil, Itália, EUA e Canadá são os principais, sendo que o objetivo é “melhorar substancialmente”, a presença em Angola, na China e na Rússia.
José Telles, diretor-geral da Niepoort, reconhece o “longo caminho” que há a percorrer, até porque, sobretudo em épocas de crise, os consumidores preferem “o valor seguro” de vinhos com marcas “conceituadas”, não têm grande vontade “de experimentar coisas novas”. Com 1,7 milhões de garrafas produzidas, entre Douro e vinho do Porto, a Niepoort tem vindo a crescer, anualmente, a dois dígitos, ritmo que abrandou em 2012, para 7%, numa faturação total de 8,2 milhões.
Com uma taxa de exportação de 80% para 56 países, a Niepoort está, agora, apostada na consolidação de mercados, sem descurar a diversificação. “Estamos a começar a colher os resultados dos investimentos feitos há anos em mercados como Angola, Moçambique e Ásia”, explica. Em 2012, a empresa entrou na Indonésia, este ano espera abrir o mercado colombiano.
Para breve está a chegada ao mercado de novos vinhos, desta feita da Bairrada, na sequência da aquisição da Quinta de Baixo, em dezembro. “Somos produtores de nicho. Em vez de crescer no Douro quisemos diversificar, apostando numa nova região e na casta Baga. Em ano cruzeiro, lá para 2017, esperamos produzir 80 mil garrafas”, explica.
Imaginação é a receita de sucesso de João Álvares Pereira, da Quinta do Vallado, que, para ultrapassar a difícil conjuntura com que se defrontam os produtos e os mercados mais tradicionais, lançou, em 2012, o Adelaide Tributa, um dos mais exclusivos vinhos do Porto no mercado. Engarrafado numa série limitada de 1300 garrafas, tem um preço de venda ao público de três mil euros. E o mercado chinês respondeu de forma excecional. “O consumidor quer produtos que lhe deem status, o preço não é problema”, diz João Álvares Pereira, reconhecendo que, “para vender caro, é preciso ter um produto com prestígio”.
Tal como referido por Soares Franco, também Álvares Pereira lamenta a quase inexistência de grandes restaurantes portugueses no mundo, que ajudem à promoção e divulgação dos vinhos portugueses, a exemplo do que acontece com França, Itália ou Espanha. Encerrado um ciclo em que foram investidos mais de 10 milhões de euros numa adega nova e num projeto de enoturismo, a Quinta do Vallado centra-se, agora, na consolidação.
Nos Verdes, os alvarinhos Soalheiro e os vinhos biodinâmicos (produzidos sem químicos e segundo o calendário lunar) da Aphros apontam a dificuldade acrescida de colocar nos mercados vinhos brancos, um produto que tem vindo a ganhar notoriedade crescente, mas que precisa, ainda, de se afirmar num mundo dominado pelos vinhos tintos (China, Angola e mesmo o Brasil são países onde o consumidor não mostra grande apetência por vinhos brancos).
Com uma produção anual de 112 mil garrafas e presente em 18 países, o Soalheiro pretende consolidar os mercados em que está e fazer “apostas cirúrgicas” em países como os EUA e o Brasil, afirma Luís Cerdeira, dos poucos com investimentos previstos para arrancar este ano: meio milhão de euros na reestruturação da adega, em Melgaço, melhorando as infraestruturas de receção a visitas e aumentando a capacidade de armazenagem.
Embora venda os seus vinhos “bem acima da média da região”, na ordem dos 15 dólares a garrafa nos EUA, ou dos 7 euros em Portugal, Vasco Croft, da Aphros, aponta a necessidade de melhorar o preço médio de venda dos vinhos Verdes. “Os que estão a ser praticados são insustentáveis. Um euro e meio gasto eu na garrafa, rótulo e rolha”, sustenta. O empresário tem um curso um investimento de 900 mil euros na construção de uma nova adega, tendo em vista o aumento do produção anual das atuais 50 mil para 120 mil garrafas ao ano em 2014. Está presente em 15 países, para os quais destina 90% do que produz. A sua aposta é em mercados “maduros e especializados, com consumidores exigentes, que mostram preferência por vinhos biológicos ou biodinâmicos”, refere.
Rui Reguinga, consultor de enologia em Portugal e na Argentina e que há seis anos arrancou com o seu projeto próprio de produção no Ribatejo, vende 50 mil garrafas e pretende, este ano, entrar nos EUA. A falta de imagem do país obriga a “um esforço imenso em termos de pricing”, reconhece, afirmando que os vinhos portugueses tivessem o “reconhecimento imediato” dos franceses e italianos, provavelmente conseguiria vender o seu vinho “ao dobro do preço”.
E dá o exemplo do mercado inglês. “Começamos a exportar com um posicionamento baixo, o que fez com que o vinho português fosse comprado nos supermercados porque era barato. Isso cria-nos dificuldades hoje para fazer valer os nossos vinhos e os nossos preços. O cliente questiona-se porque há-de pagar 15 libras por um vinho português quando está habituado a pagar 4 libras “, refere, reconhecendo que “as coisas, felizmente, estão a mudar pouco a pouco”.
Já Catarina Vieira, da Herdade do Rocim, está apostada em duplicar a capacidade produtiva (300 mil garrafas) em três a quatro anos. Este é um projeto com apenas com pouco mais de uma década, pelo que, grande parte dos 70 hectares de vinha estão, ainda, a começar a produzir. Tendo em Angola, Brasil e China alguns dos seus principais mercados, a estratégia passa por “explorar com mais profundidade”a Europa.
“Jogo de cintura e flexibilidade” são características fundamentais, refere a Catarina Vieira, para quem quer “assegurar uma solução de compromisso, acompanhando as tendências de mercado, mas sem prejudicar o seu projeto original”. Razão porque, há três anos, lançaram no mercado um vinho de gama mais baixa, estratégia igualmente seguida por muitos dos produtos 'premium' do país.
Plantar mais vinha e ampliar a adega são projetos da Wine & Soul, empresa duriense que conta atualmente com 22 hectares de vinha e produz 40 mil garrafas de vinho ao ano. Jorge Serôdio Borges, responsável pela Wine & Soul e pela Quinta do Passadouro – 40 hectares de vinha e 100 mil garrafas anuais – aponta como principais dificuldades no setor o “excesso de burocracia” e o “pouco apoio” dos restaurantes portugueses, no exterior, na divulgação dos vinhos.
Com grande presença em mercados como o Brasil, Angola, Suiça e Canadá, a aposta passa por consolidar os mercados existentes e alargar a presença a novos, de modo a contornar a eventual perda de negócio no mercado interno.
Portugal exportou, de janeiro a setembro de 2012, 481 milhões de euros de vinho, um aumento de 4,2%. Preço médio foi de de 2,12 euros" FONTE
www.dinheirovivo.pt
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