"Visita de Marcelo Rebelo resgata a importância da
Beira na viragem da página da História de Portugal
- A visita coincide menos de 24 horas de se assinalar os acontecimentos da cidade da
Beira que vieram a ser determinantes na viragem da página da História de Portugal,
do seu regime político e, consequentemente, abriram caminho à descolonização
Beira (O Autarca) – Marcelo
Rebelo, Presidente de Portugal, realiza
esta tarde uma visita histórica à cidade
da Beira. É uma visita de apenas oito
horas que inicia ao meio dia com a sua
chegada ao Aeroporto Internacional da
Beira (AIB) e termina as 08h00 da noite, com a partida do AIB de regresso a
capital moçambicana, Maputo. Apesar
de ser pouco tempo, é uma visita carregada de enorme simbolismo.
Marcelo Rebelo é o vigésimo
Presidente de Portugal e não há memória sobre outro estadista português alguma vez ter visitado a cidade da Beira, apesar da importância histórica que
a urbe tem em relação a Portugal.
Curiosamente, a visita tem lugar menos de 24 horas de se assinalar
os acontecimentos da cidade da Beira
(17 de Janeiro de 1974) que vieram a
ser determinantes na viragem da página da História de Portugal, do seu regime político e, consequentemente, abriram caminho à descolonização.
Sobre a viragem da página da
História de Portugal, comumente refere-se mais ao 25 de Abril, que recorda
a Revolução de 25 de Abril de 1974,
também conhecida como a Revolução
dos Cravos, nas ruas de Lisboa, capital
de Portugal, que abriu caminho para a
descolonização das antigas colónias
portuguesas que acabaram acedendo
suas independências no ano seguinte
Frase: Um povo que não conhece a sua história está condenado a
repeti-la – Edmund Burke (Pensador) O Autarca – Jornal Independente, Quinta-feira – 16/01/20, Edição nº 3835 – Página 02/05
Continuado da Pág. 01
(1975), incluindo Moçambique.
Mas, sobre este acontecimento
existem várias narrativas de factos antecedentes, sendo que os da Beira – um
porto índico estratégico e importante
terminal de caminho-de-ferro, são referidos com alguma insistência como
tendo sido fortemente determinantes
para a concretização do golpe em Portugal.
A revolta da Beira em relação
ao regime colonial português remonta
desde da década 60, com o vigor de D.
Sebastião Soares de Resende, Bispo da
Beira, que teve uma acção determinante na denúncia das más condições de
vida e da exploração laboral que atingia a população indígena. Antes da sua
morte, em Janeiro de 1967, na sequência de um cancro, pela sua postura crítica ao colonialismo português foi acusado pelo regime de ser comunista. No
momento da sua agonia, apesar de acompanhado por médicos em Lisboa,
quis voltar a Moçambique para ser sepultado na Beira, junto da população
que o amava e sempre a defendeu – segundo lembrou o jornalista António
Marujo num artigo sobre a vida do fundador do Jornal Diário de Moçambique, posteriormente estatalizado e hoje
adquirido por um grupo misto de empresários liderado pela família Sidat.
No início da década 70 a Beira volta a estar em ebolição. Luiz Carvalho no seu texto “Mário Tomé e Aniceto Afonso, no pátio do Museu Militar”, escreve que na memória de todos
estão bem vivos os incidentes de 1972,
em torno do caso dos padres do Macúti. Ou seja: a denúncia, a partir do púlpito daquela paróquia, dos crimes cometidos por militares contra populações negras, o que valeu a prisão e expulsão de dois sacerdotes católicos.
Segundo o autor, em Janeiro
de 1974, porém, a situação torna-se explosiva. O detonador é uma emboscada
efectuada, no dia 14, pela Frelimo nos
arredores de Vila Manica, uma zona
nunca fustigada. Entre as vítimas figura a mulher de um fazendeiro branco.
A população das cidades, que sempre
se sentira imune à guerra, fica em estado de choque. Sente-se desprotegida e
abandonada pela tropa, que é vivamente criticada. Um detalhado relatório do
movimento dos capitães da Beira dá
conta dos acontecimentos subsequenttes. Assim, a 16 de Janeiro, verifica-se
uma manifestação em Vila Pery (actual
cidade de Chimoio que dista a menos
de 200 quilómetros da cidade da Beira). Em reunião com membros do Governo e chefias militares, elementos civis afirmam «que prescindiam da presença do Exército» e reivindicam «o
fornecimento de armamento e meios de
comunicação» para a sua autodefesa.
Os protestos alastram à Beira.
No dia seguinte, 17 de Janeiro de 1974,
e por iniciativa da Associação Comercial da Beira, os comerciantes fazem
uma greve geral. Ao mesmo tempo,
uma multidão de brancos concentra-se
em frente do edifício do Governo, reclamando apoio «na repressão ao terrorismo» e a satisfação das «reivindicações apresentadas pela população» de
Vila Pery. A messe dos oficiais é o alvo privilegiado da ira popular. Perante
a passividade das forças policiais, os
militares são vaiados e insultados e a
messe apedrejada. A Polícia Militar intervém à bastonada. Ouvem-se tiros de
ambos os lados. Oito civis recebem tratamento hospitalar, enquanto um capitão parte uma clavícula.
No dia seguinte, 18, aterram na
Beira o comandante-chefe de Moçambique, general Basto Machado, bem
como o chefe do Estado-Maior General
das Forças Armadas, general Costa
Gomes, ido propositadamente de Lisboa. Machado é insultado por uma
multidão enfurecida. Há reencontros
com a PSP, enquanto novos edifícios
militares são apedrejados. Os incidentes repetem-se no dia seguinte, com a
PSP a efectuar várias prisões; uma
multidão concentra-se em frente do comando e obriga à libertação dos detidos.
Portanto, esses são alguns eventos importantes que antecederam a
Revolução de 25 de Abril, e que colocam a Beira no centro de toda atenção
para que acontecesse o golpe em Portugal e as antigas colónias acedessem a
independência que não tardou a acontecer.
Motivo mais que suficiente sublinhar que a visita de Marcelo Rebelo
resgata a importância da Beira na viragem da página da História de Portugal;
e sugerimos leitura ao artigo a seguir
(reedição) de autoria do Dr. Augusto
Macedo Pinto, Advogado■ (Chabane
Falume)"
FONTE: JORNAL O AUTARCA DE MOÇAMBIQUE
FONTE: JORNAL O AUTARCA DE MOÇAMBIQUE
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