sábado, 14 de dezembro de 2013

SUZANA JOÃO MENDES, CONSIDERADA FUNCIONÁRIA PÚBLICA EXEMPLAR NA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA DE MOÇAMBIQUE

"Suzana João Mendes: A biografia de uma “santa” tributária!
EXEMPLO de bem-servir ao público, Susana João Mendes, funcionária da Autoridade Tributária, aposenta-se sem nódoa disciplinar aos 62 anos de vida e 37 de trabalho. Segredo? “Nunca entrou em esquemas fraudulentos”.Foi assim que se resumiu a longa aventura profissional desta sexagenária. A avó Susy, como é carinhosamente tratada na Autoridade Tributária de Moçambique (AT), pode não ter figurino de diva, mas ninguém foi mais íntegra que ela em quase quatro décadas em que trabalhou para o Estado. Em tempo de despedida foi obsequiada com um almoço, em Chókwè, terra onde trabalhou pela primeira vez e que voltaria a trabalhar até à data da sua reforma. Foi homenageada pelo profissionalismo que demonstrou ao longo de três décadas dedicadas ao serviço público.  Chókwè foi onde começou a aventura profissional da avó Suzy. Estávamos no remoto ano de 1976 e o país ainda vivia a exaltação da independência nacional proclamada pelo saudoso Presidente Samora Machel, que nasceu em Chilembene. Foi Samora que apelidou Chókwè de celeiro da Nação, tamanha fertilidade para produzir o arroz.Foram-se os tempos, mas as histórias sobre esse mítico homem ainda se contam, a boca cheia, em qualquer esquina da pequena cidade. Susana Mendes, a personagem sobre a qual escrevemos hoje, chegou aqui aos 24 anos de idade. Talvez por isso ainda lhe ocorrem recordações de que Chókwè, nessa altura, era outra coisa. Olha para trás para revolver da memória curiosidades profissionais. “Apenas trabalhei duas semanas aqui e logo fui transferida para Xai-Xai”. O câmbio tinha uma causa social bem evidente: é que Ibraim Ibraim, o então director da Fazenda, descobrira que o marido dela trabalhava na antiga João Belo – Xai-Xai desde 1976 – e achou melhor juntar o casal, na convicção de juntar o útil ao agradável. Também, nessa altura, uma história andava na boca do povo, segundo a qual, uma colega da Susana, ignorando os apelos revolucionários de combate cerrada contra toda a espécie de “xiconhocas” da época, teve a ousadia e a rara coragem de negar uma transferência.Na antiga João Belo, Susana João Mendes permaneceria até 1983. Depois recebeu mais uma ordem revolucionária para ir servir a Pátria num dos lugares mais recônditos de Moçambique: Niassa. “ Fiquei em Lichinga cinco anos”, recorda-se, com alguma nostalgia. Decorria o ano 1988 quando foi movimentada para a Secção de Juízo das Execuções Fiscais de Maputo. Nunca se recusou ser transferida, porque estava convicta de que “ ficar muito tempo no mesmo lugar cria vícios, esquemas sujos e quejandos.”Jus aos seus mil princípios morais e convicções de agir de forma legal e justa, pouco tempo depois, seguiu para a então Direcção Nacional dos Contenciosos, onde ficou também cinco anos. Depois arruma bagagem para de novo regressar ao Niassa, onde permanece oito anos. Novamente volta para Chókwè, onde se aposenta, oito anos depois.
SEGREDO DO SUCESSO DA NOSSA “MADRE CALCUTÁ”
Hoje ver mulheres em posições de liderança já deixou de ser motivo de espanto. Elas disputam – e “arrancam” – cargos executivos aos que há séculos achavam que seriam os exclusivos donos de calças. O timbre feminino sobressai em discussões relevantes como quando à Susana perguntámos qual era o segredo para tamanho sucesso. Os olhos dela quase que tocam o chão do restaurante com ar clássico que fica na sobreloja do edifício que se localiza, numa das esquinas mais movimentada da pequena cidade de Chókwè. Ergue os olhos para os fixar em nenhum lugar, como que quisesse fugir à pergunta. Com surpreendente convicção, confessa: “ (…) não ser rebelde”. Não ser rebelde equivale dizer que o funcionário público deve pautar pela simplicidade. Ou melhor: “ Dar-se bem com os colegas”.
Ao longo dos 37 anos de carreira pública, Susana Mendes confessa que sempre ocupou cargos de chefia. E reconta-nos um episódio, interessante: no decurso de um seminário, ocorrido numa data que já não lhe ocorre, em Cuamba – tido como motor económico da província mais extensa, mas menos habitada de Moçambique – ela foi indicada para ser directora. Só que, alguns colegas ficaram boquiabertos. – quiçá aborrecidos – pela confiança que mereceu, questionavam se bem que “ eu nunca tinha ocupado, até à data, qualquer cargo de adjunta”, condição que se julgava sine qua non para se ascender ao tão cobiçado pelouro de direcção.Desmentida a teoria, Susana Mendes foi ascendendo degrau em degrau até à data da sua aposentação. Como uma autêntica lição de vida, eis que, quando foi consultada sobre quem poderia sucedê-la, sem pestanejar nem gaguejar, indicou uma colega que, mesmo nunca tendo assumido nenhum cargo de chefia, demonstrou competência na secretaria, sector onde esteve afecta e humildemente labutou por longos anos. “ E é ela que me substitui”, diz, a decana da AT, orgulhosa, sublinhando que se deve derrubar, de uma vez por todas, a antiga ideia de que antiguidade pode ser passaporte para a chefia de posto.
PEDAÇOS DA VIDA EM FEL
Com a mesma simetria com que se atesta que não há rosa sem espinhos, também se desengane quem pensa que todo o percurso profissional da vovó Susy sempre foi marcado por mel. Nada disso. Até pelo contrário: há bem pouco tempo ela caiu doente, mas quase que nenhum colega dos serviços sociais foi espreitá-la. Com fé assente de que Deus ainda tem mais missões para si, saiu viva. Ainda em recuperação, não esconde o desagrado provocado pela falta de visita dos condiscípulos profissionais. Visivelmente enfraquecida, quase que faz um enorme esforço para conter as lágrimas quando se lembra que, ao longo dos dias que esteve no leito do hospital, apenas contou com a ajuda dos seus filhos. Se é natural, curioso é que ela mesma diz que nunca imploraria apoio financeiro – ainda que necessário nestas circunstâncias. Mas entende que, no quadro das atribuições da Direcção dos Serviços Sociais da AT, uma singela visita haveria de transmitir o calor sempre necessário de colegas. Como uma perfeita encarnação da Madre Teresa de Calcutá, Susana Mendes diz que não guarda rancores, pois, consegue fintar a mágoa mesmo quando, por alguma razão, é momentaneamente atacada pela lembrança do abandono de que foi vítima. E manda recado: “ (…) que o mesmo não ocorra com os outros colegas…Só isso”.
ODIADA POR UNS, AMADA POR OUTROS
Como qualquer moçambicano, Susana não esteve imune a conjunturas com que o país se bateu durante anos que ao serviço da Pátria que lhe chamou para diferentes unidades de trabalho. Sempre vigilante contra toda a forma de fraude, atraiu para si todo o tipo de azares pelos quais pagou muito caro. Muitas agruras marcaram a sua vida, mas o de 1998, deixa marca indelével: Luísa Diogo, na sua visita ao Niassa enquanto ministra das Finanças, foi interpelada por alguns comerciantes que foram bater à porta para falar mal dela. “ Disseram que não servia porque não aceitava entrar em esquemas e que isso não os ajudava”.Esse incidente foi objecto de mil comentários em todas as esquinas de Nampula, pois, ainda nesse périplo, a Luísa Diogo os comerciantes, pensando que estavam a elogiar, confessaram que os chefes, cujos nomes se omitem por razões ético-deontológicas – eram seus “bradas”. Só que isso foi uma bala que saiu pela culatra, pois enquanto em Lichinga, onde os comerciantes se queixaram do dedo duro da Susana, as receitas estavam em alta, já em Nampula era justamente o contrário: havia razia de receitas. Luísa Diogo inquiriu: “ Como e porquê os comerciantes e chefes daqui em Nampula são `bradas?’ 
RECUSAR LOJA, ENVELOPES… E JUBILAR-SE POBRE!
Num destes dias encontrávamo-nos em Chókwè, debaixo de 35 graus só atenuados pelo vento que se sente pelo abanar das acácias. Enquanto esperávamos pela cerimónia oficial da homenagem – ou melhor: pelo sumptuoso almoço de despedida – vamos arrancando pedaços da biografia desta vovó, que é uma autêntica biblioteca viva. Nisto, conta que na primeira vez que ela foi transferida para o Niassa, o marido opôs-se, por justificável razão. “ Eu também me opus e disse-lhe que iria para o Niassa”. Na contramão, o consorte esgrimiu argumentos. Nada. Contrapôs com uma medida grande, prometendo que, se ela não fosse para o Niassa, ganharia uma loja para ela. Também em vão: ela contornou a oferta e foi para o Norte.Passaram-se anos e anos até que um dia regressou para Maputo. Quando se pensava que tudo estava nos carris, eis que, de novo, chega a sempre “má notícia” para os ouvidos do seu marido: segunda transferência para Lichinga. Como sempre, o marido desdobrou-se em promessa aqui, argumento acolá. Mas nem por isso. E, como se não bastasse, desta vez foi mais ousada ainda pelo modo como se apartou do esposo: “ (…) disse lhe simplesmente que a Pátria chama por mim (…)”.  E embarcou.A biografia da vovó Susy é apetecível. Poderíamos ficar horas a fio a conversar com decana da AT. Mas é uma ilusão pensar que podemos esgotá-la. Enquanto esperamos pelo já atrasado regabofe, vamos ouvindo o que é possível. Ela não receia em auto nomear-se uma das heroínas de que este país pode orgulhar-se em tê-las. “ (…) Eu nunca me meti em esquemas…talvez por isso que sou pobre”.O eufemismo não é sem causa justa: conta ela que um certo dia, um empresário – de Chókwè, o qual esteve no almoço da sua homenagem a convite especial dela – telefonou para ela, marcando encontro urgente e muito importante. Sem preconceito e atendendo a tamanha urgência anunciada pelo empresário pelo telemóvel, Susana João Mendes decidiu recebê-la em casa do Estado onde viveu até se aposentar. Se dissermos que foi uma surpresa, até pode ser favor: para a agonia dela, o comerciante mal irrompeu sala adentro, estendeu-lhe um envelope à mão. Não recebeu. Inquiriu do que se tratava. Ele disse, peremptório: “(…) é refresco para si, senhora directora!” Mais agonia. Incrustada nos seus princípios de nunca se meter em esquemas que defraudam o Estado, pura e simplesmente ela nem sequer quis saber da quantia que o envelope continha. “Eu disse ao empresário que não queria perder o meu salário por causa de um envelope”. Ante a insistência do empresário para receber a “grana preta”, educadamente, Susana convidou o empresário a retirar-se, antes que medidas drásticas e legalmente previstas contra corruptela fossem imediatamente accionadas.Este episódio faz-lhe cogitar que a riqueza – injustificada – de alguns colegas seja consequência dos esquemas que criam com empresários como o acima descrito. “Eu fico admirado quando, em tão pouco tempo de trabalho, vejo que alguns colegas começam a exibir bens que, comparados com o salário que ganham, não poderiam ter…onde eles arranjam esse dinheiro?”.Susana diz que, contrariamente a certos colegas que se enriquecem por via de esquemas sujos, nunca lhe passou pela cabeça usar os privilégios que os cargos de chefias proporcionam para resolver questões pessoais. Ou ao menos construir uma mansão. Ao invés disso, com o pouco que ganhava preferiu investir na educação dos filhos. Aposentada, diz que hoje enfrenta o desafio de voltar a morar na mesma casa que abandonou há mais de 30 anos. Talvez por isso às vezes é tentada a cogitar que hoje é pobre porque sempre se recusou em receber envelopes. “ Nem casa tenho”, diz, sem, todavia, manifestar algum sindroma de arrependimento tardio porque sempre meteu na cabeça que as receitas são para o Estado, e nunca para os bolsos de funcionários, individualmente, em cambalacho com empresários desonestos.
A REFORMA COMO UMA BÊNÇÃO
Hoje quando olha para esse percurso, a sensação que fica é de extrema alegria, pois “ atingir a idade da reforma é uma autêntica bênção”. Ela diz que se apercebeu, há muito tempo, que certos colegas não degustam a ideia de reformas, daí que cedem a qualquer tentação de continuarem ligados ao Estado.Ela mesma diz que foi assediada a continuar a trabalhar em Boane ou Tchumene, em Maputo, mas declinou-se porque “ acho que não tenho mais forças…e não as tendo, aceitar esse convite equivaleria prejudicar o próprio Estado”.Contra colegas que não (re) querem reformas, Susana não tem dúvidas que com a força da juventude para administração dos impostos e outras contribuições vai melhorando, cada vez. E está decidida: “daqui em diante vou cuidar da minha gaiola, hortinha e dos meus netos”.  Até ao último dia. 
VALOR DOS RECURSOS HUMANOS: UM RESGATE CONSEGUIDO 
A Autoridade Tributária de Moçambique (AT) é um dos órgãos do Estado encarregue pela gestão das áreas tributária e fiscal. A qualidade dos serviços prestados mede-se igualmente pela eficiência das decisões tomadas durante os dois mandatos do Presidente Armando Emílio Guebuza, cuja eficácia pode se medir pelo alto grau de desempenho dos seus funcionários, agentes e outros colaboradores do Estado.Segundo o artigo 139 do Estatuto Geral dos Funcionários e Agentes do Estado, EGFAE, a aposentação constitui uma garantia social que o Estado reconhece aos seus funcionários e agentes, desde que tenham satisfeito ou venham a satisfazer os encargos para pensão (de aposentação). O artigo 140 determina que têm direito à aposentação os funcionários ou agentes do Estado, seja qual for a forma de provimento ou natureza da prestação de serviço, desde que tenham completado, 35 anos de serviço, 60 ou 55 anos de idade, consoante sejam homens ou mulheres, respectivamente, e que tenham prestado pelo menos 15 anos de serviço. Ou ainda tenham pelo menos completado 15 anos de serviço quando julgados absolutamente incapazes.Note-se, no entanto, que o limite de idade (aposentação obrigatória) pode ser prorrogado anualmente, desde que haja interesse do serviço, anuência do funcionário e parecer favorável da Junta de Saúde. Neste caso, o tempo de trabalho prestado é acrescido ao que já contava à data do limite de idade. Assim, a AT tem nos recursos humanos a ferramenta central para o seu contributo em prol do desenvolvimento do país. O incremento crescente das fontes de financiamento ao Orçamento do Estado, mormente na elevação e ampliação dos níveis de colecta de receita, afigura-se o caminho a seguir rumo à sustentabilidade e, quiçá, independência económica.Em cumprimento das orientações do Ministério da Função Pública, contidas no Oficio nº257/MFP/GM/2010, de 4 de Fevereiro, sobre a obrigatoriedade de cumprimento do acima exposto, a DRH da AT efectuou um levantamento que culminou com a identificação de cerca de 100 funcionários que atingiram um ou ambos os factores determinantes da aposentação. É nesse grupo em que se encontra Susana João Mendes. 
Anselmo Titos  - Colaboração."
FONTE: JORNAL NOTICIAS DE MOÇAMBIQUE.

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