sexta-feira, 19 de abril de 2019

AINDA O CICLONE IDAI, CIDADE DA BEIRA, CAPITAL DA PROVINCIA DE SOFALA, MOÇAMIQUE - TESTEMUNHO


AINDA O CICLONE IDAI, CIDADE DA BEIRA, CAPITAL DA PROVINCIA DE SOFALA, MOÇAMIQUE - TESTEMUNHO

Para quem viveu a NEGRA NOITE de 14 de Março de 2019, na cidade da Beira e pelos outros locais por onde passou o demoníanico ciclone que dá pelo nome de IDAI, em particular na Provincia de Sofala, vidas humanas que se perderam ainda em fase de levantamento do seu número, pelo que já se conhece serão várias centenas,   pessoas há, nacionais e estrangeiros cuja situação de localização e estado de saúde está ainda por esclarecer, foram muitos que ficaram sem nada, alguns do pouco que já tinham.
A solidariedade nacional e internacional, entretanto não se fez esperar, chegam de todos os lados e por todas as vias, a rodoviária só  dias mais tarde pode ter inicio, porque a estrada principal, estrada nacional nº 6,  de acesso à cidade da Beira ainda esteve intransitável, durante 10 dias após o ciclone. Havia sofrido graves e avultados estragos.
O Governo de Moçambique criou uma “task force governamental” tendo como coordenador o Ministro da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural, MITADER, Celso Correia. A figura sempre presente por vários locais mais afectados da Provincia é o Governador da Provincia de Sofala Alberto Mondlane. O Conselho de Ministro sob a Presidência do Presidente da República de Moçambique Filipe Jacinto Nyusi reuniu pela primeira vez na cidade da Beira, na primeira Terça feira imediatamente seguinte ao Ciclone. Vários Ministros se vêm revesando com a sua presença em Sofala. O INGC liderado pela sua Directora Geral Augusta Maíta, fez-se ao terreno percorrendo nas suas múltiplas tarefas as zonas da Província de Sofala mais afectadas.
Os pesados estragos na cidade da Beira são evidentes e generalizados, os edificios com os telhados e algumas paredes destruidas, as centenárias árvores arrancadas pela raiz ao longo de todas as ruas, os fios e postes derrubados sejam de electricidade, redes móveis ou internet por cabo. A cidade ficou sem energia electrica durante mais de uma semana, o abastecimento de água potável nas torneiras pelo FIPAG foi o primeiro dos bens sociais a ser reposto, as comunicações telefónicas de todas as redes faz-se ainda com alguns cortes. A internet da TVCABO ainda se encontra inoperacional. Como consequência não temos comunicaçao por email, nem televisão por via deste meio de comunicação desde 14 de Março.
Portugal não se fez esperar, terá  sido o primeiro País Europeu a enviar um membro do seu Governo que verdadeiramente “acampou” na Beira. O Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas José luis Carneiro, este governante, fez-se acompanhar de elementos do INEM, protecção civil e militares. Houve um primeiro encontro com a comunidade portuguesa, ainda em estado de choque, compreensivelmente também  em estado de alguma irritabilidade, ouviram o Secretario de Estado e de uma forma reivindicativa, perdoem-me o paralelismo, fez-me lembrar os tempos em Portugal pós 25 de Abril de 1974. Algumas acusações e comentários perfeitamente evitáveis, face ao momento e contexto. É claro,  a opinião de quem não chegou há pouco tempo a Moçambique, mas em 1953, viveu quase vinte anos em Tete, teve de sair de casa em 1958, pois o Zambeze entrou pela casa dos seus pais a dentro até uma altura de um metro e quarenta centimetros e valeu-nos a solidariedade de amigos,  ficamos um mês em casa de grandes amigos dos meus pais, a familia Gonçalves. Tinha rebentado a barragem do Kariba em fase de construção. Quando chegados a Tete em 1955, não havia saneamento básico, não havia ruas asfaltadas, nem passeios cimentados, só havia energia electrica das 16h00m às 22h00m, não havia ponte sobre o Zambeze entre Tete e Matundo, não havia ponte do Revubué, ligando o Matundo a Moatize, não havia o aeroporto do Chingodzi, não havia tanta coisa....Por exemplo 2 a 3 médicos para toda a Provincia de Tete. O querido e saudoso professor Carlos Almeida foi incomodado pela PIDE, por ter feito a quadra: “TETE A CIDADE QUE SEDUZ, DE DIA NÃO HÁ ÁGUA E DE NOITE NÃO HÁ LUZ”.
De Portugal chegaram dois C 130 e um Boeing, outros foram chegando. Trouxeram, médicos, enfermeiros, militares especialistas em busca e salvamento, pessoal dos bombeiros, das forças de segurança GNR e Policia, técnicos da EDP, técnicos das Águas de Portugal ( EPAL) e mais que não consigo especificar. Também cães de busca e salvamento. Vieram medicamentos oferecidos pelo Hospital da CUF, através da HEALTH4MOZ, ONGD do Porto,  entregues no Hospital Central da Beira,  já habitual em Moçambique em acções de formação médica na Beira, Quelimane, Nampula e Maputo, produtos alimentares de primeira necessidade, kits de higiene masculina e feminina, etc, etc.
O Governo Português através do seu Secretário de Estado orientou dois encontros com a comunidade portuguesa, um na Quinta-feira já referido e outro no Domingo, nas instalações do Instituto Camões, no R/C, do edificio do Consulado Geral de Portugal na Beira, instalações estas sobreviventes ao Ciclone IDAI. A comunidade portuguesa nos dois encontros havidos ficou a saber dos apoios imediatos e possiveis,  nomeadamente da sua evacuação por razões de saúde ou outras, já embarcaram alguns cidadãos portugueses nesse âmbito, outros foram assistidos com apoio médico e medicamentos, produtos alimentares de primeira necessidade.
Como português e crítico que habitualmente sou, considero excelente a actuação do Governo português com a comunidade portuguesa da Beira da qual faço parte, foi pronta e eficaz. Muitos outros Países amigos de Moçambique se fizeram presentes com os seus apoios,  oriundos de todos os continentes.
As Nações Unidas, seus vários organismos nomeadamente OMS, UNICEF, PMA, outras entidades de reputada idoneidade de reconhecimento internacional chegaram a Sofala e não têm tido mãos a medir.
É evidente que as pessoas que no fatidico dia 14 de Março se encontravam na zona visitada pelo sinistro IDAI se encontram de uma forma bastante abalada sob ponto de vista psicológico, independentemente dos danos sofridos sejam  pessoais ou das suas infraestruturas, bens de equipamento, etc. É indescritivel o verdadeiro terror que se viveu com a passagem por nós, deste monstro da natureza que dá pelo nome de IDAI. Algumas epidemias habituais segundo os conhecedores neste dominio começaram a surgir, mas felizmente estão a ter a resposta adequada quando aos meios preventivos disponibilizados na comunidade afectada, como actuando com os tratamentos adequados nos casos de necessidades curativas. Não há pânico, nem alarme.
Gradualmente e posso crer,  graças à compreensão generalizada da familia, longe ou perto de nós, dos amigos, das entidades oficiais, da solidariedade nacional e internacional, de forma positiva e construtiva fazendo fazendo face às adversidades fazendo jus a um velho ditado, por vezes com as  adversidades, surgem novas oportunidades. Uma homenagem muito especial para aqueles que infelizmente nos deixaram por causa desta tragédia que se abateu sobre nós. O espirito é de reconstrução e de força anímica para uma nova realidade que dependerá de todos nós!
Autor: Augusto Macedo Pinto, Parcialmente publicado no MAGAZINE INDEPENDENTE, EDIÇÃO DE 16 de Abril de 2019

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