AINDA O CICLONE IDAI,
CIDADE DA BEIRA, CAPITAL DA PROVINCIA DE SOFALA, MOÇAMIQUE - TESTEMUNHO
Para quem viveu a NEGRA NOITE de 14 de Março de 2019, na
cidade da Beira e pelos outros locais por onde passou o demoníanico ciclone que
dá pelo nome de IDAI, em particular na Provincia de Sofala, vidas humanas que
se perderam ainda em fase de levantamento do seu número, pelo que já se conhece
serão várias centenas, pessoas há, nacionais e estrangeiros cuja
situação de localização e estado de saúde está ainda por esclarecer, foram
muitos que ficaram sem nada, alguns do pouco que já tinham.
A solidariedade nacional e internacional, entretanto não se
fez esperar, chegam de todos os lados e por todas as vias, a rodoviária só dias mais tarde pode ter inicio, porque a
estrada principal, estrada nacional nº 6, de acesso à cidade da Beira ainda esteve
intransitável, durante 10 dias após o ciclone. Havia sofrido graves e avultados
estragos.
O Governo de Moçambique criou uma “task force governamental”
tendo como coordenador o Ministro da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural,
MITADER, Celso Correia. A figura sempre presente por vários locais mais
afectados da Provincia é o Governador da Provincia de Sofala Alberto Mondlane.
O Conselho de Ministro sob a Presidência do Presidente da República de Moçambique
Filipe Jacinto Nyusi reuniu pela primeira vez na cidade da Beira, na primeira
Terça feira imediatamente seguinte ao Ciclone. Vários Ministros se vêm
revesando com a sua presença em Sofala. O INGC liderado pela sua Directora
Geral Augusta Maíta, fez-se ao terreno percorrendo nas suas múltiplas tarefas
as zonas da Província de Sofala mais afectadas.
Os pesados estragos na cidade da Beira são evidentes e
generalizados, os edificios com os telhados e algumas paredes destruidas, as
centenárias árvores arrancadas pela raiz ao longo de todas as ruas, os fios e
postes derrubados sejam de electricidade, redes móveis ou internet por cabo. A
cidade ficou sem energia electrica durante mais de uma semana, o abastecimento
de água potável nas torneiras pelo FIPAG foi o primeiro dos bens sociais a ser
reposto, as comunicações telefónicas de todas as redes faz-se ainda com alguns
cortes. A internet da TVCABO ainda se encontra inoperacional. Como consequência
não temos comunicaçao por email, nem televisão por via deste meio de
comunicação desde 14 de Março.
Portugal não se fez esperar, terá sido o primeiro País Europeu a enviar um
membro do seu Governo que verdadeiramente “acampou” na Beira. O Secretário de
Estado das Comunidades Portuguesas José luis Carneiro, este governante, fez-se acompanhar
de elementos do INEM, protecção civil e militares. Houve um primeiro encontro
com a comunidade portuguesa, ainda em estado de choque, compreensivelmente
também em estado de alguma
irritabilidade, ouviram o Secretario de Estado e de uma forma reivindicativa,
perdoem-me o paralelismo, fez-me lembrar os tempos em Portugal pós 25 de Abril
de 1974. Algumas acusações e comentários perfeitamente evitáveis, face ao
momento e contexto. É claro, a opinião
de quem não chegou há pouco tempo a Moçambique, mas em 1953, viveu quase vinte
anos em Tete, teve de sair de casa em 1958, pois o Zambeze entrou pela casa dos
seus pais a dentro até uma altura de um metro e quarenta centimetros e
valeu-nos a solidariedade de amigos, ficamos um mês em casa de grandes amigos dos
meus pais, a familia Gonçalves. Tinha rebentado a barragem do Kariba em fase de
construção. Quando chegados a Tete em 1955, não havia saneamento básico, não
havia ruas asfaltadas, nem passeios cimentados, só havia energia electrica das
16h00m às 22h00m, não havia ponte sobre o Zambeze entre Tete e Matundo, não
havia ponte do Revubué, ligando o Matundo a Moatize, não havia o aeroporto do
Chingodzi, não havia tanta coisa....Por exemplo 2 a 3 médicos para toda a
Provincia de Tete. O querido e saudoso professor Carlos Almeida foi incomodado
pela PIDE, por ter feito a quadra: “TETE A CIDADE QUE SEDUZ, DE DIA NÃO HÁ ÁGUA
E DE NOITE NÃO HÁ LUZ”.
De Portugal chegaram dois C 130 e um Boeing, outros foram
chegando. Trouxeram, médicos, enfermeiros, militares especialistas em busca e
salvamento, pessoal dos bombeiros, das forças de segurança GNR e Policia,
técnicos da EDP, técnicos das Águas de Portugal ( EPAL) e mais que não consigo
especificar. Também cães de busca e salvamento. Vieram medicamentos oferecidos
pelo Hospital da CUF, através da HEALTH4MOZ, ONGD do Porto, entregues no Hospital Central da Beira, já habitual em Moçambique em acções de formação
médica na Beira, Quelimane, Nampula e Maputo, produtos alimentares de primeira
necessidade, kits de higiene masculina e feminina, etc, etc.
O Governo Português através do seu Secretário de Estado
orientou dois encontros com a comunidade portuguesa, um na Quinta-feira já
referido e outro no Domingo, nas instalações do Instituto Camões, no R/C, do
edificio do Consulado Geral de Portugal na Beira, instalações estas
sobreviventes ao Ciclone IDAI. A comunidade portuguesa nos dois encontros
havidos ficou a saber dos apoios imediatos e possiveis, nomeadamente da sua evacuação por razões de
saúde ou outras, já embarcaram alguns cidadãos portugueses nesse âmbito, outros
foram assistidos com apoio médico e medicamentos, produtos alimentares de
primeira necessidade.
Como português e crítico que habitualmente sou, considero
excelente a actuação do Governo português com a comunidade portuguesa da Beira
da qual faço parte, foi pronta e eficaz. Muitos outros Países amigos de
Moçambique se fizeram presentes com os seus apoios, oriundos de todos os continentes.
As Nações Unidas, seus vários organismos nomeadamente OMS,
UNICEF, PMA, outras entidades de reputada idoneidade de reconhecimento internacional
chegaram a Sofala e não têm tido mãos a medir.
É evidente que as pessoas que no fatidico dia 14 de Março se
encontravam na zona visitada pelo sinistro IDAI se encontram de uma forma
bastante abalada sob ponto de vista psicológico, independentemente dos danos
sofridos sejam pessoais ou das suas
infraestruturas, bens de equipamento, etc. É indescritivel o verdadeiro terror
que se viveu com a passagem por nós, deste monstro da natureza que dá pelo nome
de IDAI. Algumas epidemias habituais segundo os conhecedores neste dominio
começaram a surgir, mas felizmente estão a ter a resposta adequada quando aos
meios preventivos disponibilizados na comunidade afectada, como actuando com os
tratamentos adequados nos casos de necessidades curativas. Não há pânico, nem
alarme.
Gradualmente e posso crer, graças à compreensão generalizada da familia,
longe ou perto de nós, dos amigos, das entidades oficiais, da solidariedade
nacional e internacional, de forma positiva e construtiva fazendo fazendo face
às adversidades fazendo jus a um velho ditado, por vezes com as adversidades, surgem novas oportunidades. Uma
homenagem muito especial para aqueles que infelizmente nos deixaram por causa
desta tragédia que se abateu sobre nós. O espirito é de reconstrução e de força
anímica para uma nova realidade que dependerá de todos nós!
Autor: Augusto Macedo Pinto, Parcialmente publicado no MAGAZINE INDEPENDENTE, EDIÇÃO DE 16 de Abril de 2019
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