Domingas Mosse é das poucas mulheres que se orgulha por ter iniciado o seu primeiro negócio na desportiva. Como quem não quer. Hoje, ela marca presença no mercado através de aperitivos de castanhas de caju e amendoim torrado, de diferentes sabores, e já é uma referência no ramo. Conversamos com ela sobre as suas perspectivas, sonhos e desafios.
Quando e como surgiu a ideia de criar uma empresa?
Foi um atrevimento.
Como assim?
Tudo começou na Beira entre 1999 e 2000. Uma amiga camaronesa ensinou-me a preparar amendoim e castanhas torradas com diferentes sabores, salgados, com piri-piri e açucarados para servir em nossas festas. Depois passamos a fazer para oferecer familiares, mas sempre em pequenas quantidades. De repente começamos a ter pedidos de amigos, colegas que queriam levar tanto a castanha como amendoim em viagem.
Até aí era apenas por prazer? Um hobbie…
Sim. Como negócio comecei em 2003 quando me casei e vim viver para Maputo. A mudança de cidade obrigou-me a interromper os estudos e para não ficar de braços cruzados enquanto aguardava pelo inicio do ano lectivo decidi retomar o que era meu passatempo, mas desta vez para venda.
Onde adquiria a castanha e o amendoim?
Localmente. Depois passei a trabalhar com senhoras de rua que passaram a descascar por mim.
E como vendia?
No início vendia em frascos de maionese. Levava o produto para instituições. Os clientes pagavam no final do mês.
Nessa altura, o negócio já era lucrativo?
Pouca coisa. Era uma forma de fazer alguma coisa para me entreter. Mais tarde a minha amiga camaronesa que me ensinou a fazer os acepipes em Nampula veio viver para Maputo e decidimos tornar a coisa mais séria. Posteriormente inscrevi a empresa em nome pessoal.
Já tinha feito algum negócio antes?
Pessoalmente, não. Mas cresci vendo minha mãe a fazer. Ela dizia que as mulheres têm que ter sempre um dinheiro extra para satisfazer as suas necessidades como sair com as amigas para tomar um sorvete ou comprar uma peça de roupa sem fazer desvio de aplicação do dinheiro de casa ou de rancho.
Em algum momento pensou em desistir do negócio?
Acho que o facto de não ter levado este negócio a sério no começo ajudou porque tive alguns contratempos que poderiam me ter levado a desistir. Um pouco mais tarde, há cerca de dois ou três anos, sim. Passamos por dificuldades que nos levaram a pensar em desistir, mas depois ganhamos estabilidade.
Que dificuldades enfrentaram?
Comprávamos embalagens num fornecedor e às vezes esgotava o stock e isso obrigava-nos a mudar o tipo de invólucro sistematicamente.
E hoje esse constrangimento está superado?
Está. Quando iniciamos o negócio comprávamos entre 500 e 1000 frascos para embalar o nosso produto. Agora compramos acima de dez mil frascos que esgotam em pouco mais de quatro meses. Felizmente temos um local onde armazenamos a nossa embalagem, o que é um grande alívio.
E a castanha e amendoim? Como formam o vosso stock?
Tivemos problemas para adquirir castanhas em quantidade. Enquanto nós comprávamos em Maputo,tínhamos concorrentes que iam até à fonte, por exemplo Manjacaze, e adquiriam directamente junto dos apanhadores e ou proprietários dos cajueiros com a vantagem de pagarem no fim do mês, isto é, levavam a crédito.
E como conseguiram ultrapassar esse obstáculo?
Adoptamos a estratégia do pronto pagamento. Hoje temos tido castanha de Manjacaze, Nampula e Macia.
Qual é o ponto de situação actual do negócio?
Actualmente conseguimos ter uma margem que dá para criar condições para que o negócio não pare. Vamos empurrando.
Têm quantos trabalhadores?
São oito, dos quais dois são homens que cuidam da parte administrativa. As mulheres fazem somente o processamento.
Porquê apenas mulheres?
Porque processar é cozinhar e os homens têm muito preconceito na cozinha.
Já recorreu ao crédito bancário?
Uma vez tivemos uma crise de falta de castanha e ponderamos a hipótese de importar uma tonelada, mas não tivemos sucesso com a banca. Muita gente diz que o moçambicano não gosta de lutar, mas não é isso. Às vezes precisa de apoio para iniciar e não tem onde buscar dinheiro.
Onde buscou inspiração para se lançar nos negócios?
Em Deus e no meu marido. Temos outros negócios. Somos aventureiros.
EMANICIPAÇÃO
DA MULHER
Há pouco falou dos preconceitos dos homens em relação à cozinha. A nossa sociedade está preparada para estas conquistas da mulher?
Penso que sim. Contudo, o que tenho visto acontecer algumas vezes é que quando conquistamos este espaço, nós mulheres mudamos de atitude e esquecemos quem somos. Confundimos o conceito de emancipação. Pensamos que ser emancipada é sentirmo-nos com poder para pôr o marido a escovar o chão, a cuidar do bebé todos dias…. Eu penso que a emancipação não está a ser devidamente transmitida por nós.
Estaríamos a buscar referências erradas?
Provavelmente, sim. Vemos as europeias que quando estão no nosso meio questionam porque é que a mulher tem que engomar a camisa do marido, fazer chá, se ela trabalha tal como o marido. Mas nós não fomos educadas assim. Sempre conseguimos ir trabalhar, voltar e cuidar dos nossos filhos e de outros afazeres com toda a naturalidade. Não pretendo dizer que os homens não devem apoiar as mulheres inclusive na cozinha.
Luísa Jorge
luisa.jorge@snoticicas.co.mz"
luisa.jorge@snoticicas.co.mz"
FONTE: JORNAL DOMINGO DE MOÇAMBIQUE.
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