"Aqui há tomate: como Portugal ganha terreno no mercado global
Sementes de tomate no viveiro Pré Planta
Diana Quintela
Diana Quintela
Chove torrencialmente na reta do cabo, entre Vila Franca e Porto Alto, junto à lezíria do Tejo. Cidalina Silva está preocupada com a chuva. "No ano passado, em abril, os campos estavam prontos a plantar, hoje estão alagados", diz Filipe Borba de Andrade e Sousa, de 53 anos, sócio de Cidalina, uma das maiores produtoras de tomate do país. A viúva de 55 anos é agricultora desde criança, tinha 10 quando começou, embora goste de se descrever de outra maneira."Acabei a quarta classe e fui logo ajudar o meu pai, até começar a produzir sozinha uns seis ou sete hectares. Depois, o meu pai retirou-se. Fiquei eu a cuidar das terras." Cuidar das terras, é uma expressão que não faz justiça aos 250 hectares destinados à produção de tomate de que ela cuida e acompanha pessoalmente até resultarem nas 30 mil toneladas anuais vendidas diretamente à indústria. Muito tomate, sim, e muita terra também, é verdade, mas para uma faturação de apenas 2,3 milhões de euros.Ainda assim, a produção de tomate em Portugal está longe de ser amadora. No ano passado, o país foi o segundo maior produtor por hectare logo a seguir à Califórnia, com um total de 1,2 milhões de toneladas cultivadas. Foi também o quarto maior exportador de tomate transformado - depois dos Estados Unidos, da China e Itália -, vendendo 1,2 milhões de toneladas por 250 milhões de euros. "O tomate de indústria é o único sector 100% organizado", diz ao Dinheiro Vivo o secretário de Estado da Agricultura, José Diogo Albuquerque. Já ninguém faz tomate à mão, isso é coisa do passado. As sementes - que são compradas às norte-americanas Heinz (a do ketchup) e à Campbell (a da lata de sopa de tomate de Andy Warhol) - crescem em viveiros, onde tudo, desde a rega ao abrir de uma janela, é controlado por computador. As plantas - ainda sem o tomate - vão depois para os produtores, que as cultivam, regam, cuidam e apanham com máquinas e as vendem às fábricas, que as transformam em molhos e concentrados.Só Filipe Sousa e Cidalina Silva entregaram, no ano passado, mil camiões de tomate nas fábricas. E a Sugalidal - que é o maior produtor agrícola e também a maior indústria de transformação do país - esteve muito perto de produzir 100 mil toneladas. Este ano, apesar das chuvas inclementes, quer chegar às 120 mil e aumentar a área de cultivo de 900 para 1200 hectares.Mas tudo isto é recente. Em apenas 20 anos, desenvolveu-se a rega gota a gota - que permite aproveitar melhor as terras - ,trouxeram-se as máquinas, reduziu-se o número de produtores de cinco mil para cerca de 500. A produtividade cresceu de 50 para 94 toneladas por hectare e o tomate transformou-se num negócio de sucesso que "não cria milionários, mas em que se ganha dinheiro", diz Miguel Cambezes - embora mais na indústria do que na produção agrícola, porque exportam tudo. Só as duas fábricas da Sugalidal, em Benavente e na Azambuja, faturam 100 milhões de euros. E na FIT e na Italagro, dos japoneses da Kagome e do empresário Martin Stilwell, as vendas são de 55 milhões.Martin Stilwell tem 64 anos e, apesar de não ser filho de seareiros, desde os 19 que trabalha na indústria do tomate em Portugal. Além de exportarem o concentrado de tomate para o Japão, produzem molhos de pizza, de receita própria, para a Pizza Hut, Telepizza e Domino's Pizza e para restaurantes na Europa. "Se for a um restaurante italiano em Londres, há 70% de probabilidade de o molho de tomate da pizza ser nosso", diz Stilwell.
O que é que o tomate português tem?O tomate português tem de ter alguma coisa de especial para que 95% do produto transformado seja procurado lá fora. "Sempre exportámos quase tudo. Há 20 anos, iam bidões de garagem para a União Soviética. Hoje, vendemos para o mundo inteiro", conta Miguel Cambezes. Porquê? Simples: "O nosso tomate tem a melhor cor, é vermelho-vivo, é brilhante, e isso é importante nos molhos. E depois tem um sabor mais frutado e doce do que ácido." Foi por isso que os japoneses compraram a FIT e a Italagro. "Usam-no para fazer sumo, molhos e até protetores solares bebíveis à base de licopeno, que é uma substância do tomate que previne o cancro", explica Martin Stilwell.
São as condições meteorológicas e geológicas que tornam o tomate português um dos melhores do mundo. "A maior parte da produção está no vale dos rios Sorraia e Tejo, perto do mar, e além da humidade temos solos arenosos e nunca temos nem muito frio nem muito calor", diz Miguel Cambezes. É por isso que o tomate é plantado em abril e maio e colhido entre finais de julho e meados de setembro. E é também por isso que a chuva toda que caiu em março atrasa o processo e coloca em risco a produção, porque assim que começar o calor o tomate já tem de estar crescido e não ainda a crescer. Em Santo Isidro, que pertence à Sugalidal, estão 50 milhões de plantas de tomate que já deviam estar cultivadas, conta a responsável, Isabel Almeida. É mais de metade da capacidade deste viveiro.Marcos Cabrito é engenheiro agrónomo nos viveiros PréPlanta, em Samora Correia, e também se queixa do mesmo. "Estamos a ficar com falta de espaço porque o tomate não sai, mas não o podemos pôr na rua e não o podemos deixar estragar até porque é muito caro." Quanto? Cada pacote de 100 mil sementes - que dá para uns três hectares - custa 600 euros.Cidalina Silva diz que só lá para maio é que se deve entrar nas terras e suspira. "Se não fossem os meus filhos, já não andava nesta vida." E o que ia fazer depois? "Talvez plantar milho, que dá menos trabalho." Mas Filipe e Cidalina têm hoje uma grande responsabilidade. Vendem parte da sua produção à Sugalidal. Eles e outros seis mil agricultores, além da produção própria da empresa. As duas fábricas, uma em Benavente e outra na Azambuja, transformam 550 mil toneladas de tomate por ano. Os concentrados vão para a Rússia, para o Japão e quem sabe para a Arábia Saudita, onde se bebe muito sumo de tomate. Já os molhos e as polpas da Guloso - a marca própria - ficam em Portugal e os vários tipos de molhos e ketchup da Heinz vão para o Norte da Europa.À frente da empresa, responsável pelo negócio internacional, está João Ortigão Costa, de 44 anos, também ele descendente de uma família de industriais de tomate. Era gestor hoteleiro e o amor à camisola ganhou-o depois de entrar no negócio, há 15 anos. "Na altura a Sugalidal faturava sete a oito milhões e hoje fatura 100 milhões só em Portugal. Só gostando é que se chega a estes números", diz. Com as unidades de Espanha e do Chile, a faturação vai chegar aos 200 milhões. Num ano, com a compra da unidade do Chile em 2012, a Sugalidal passou de 15.ª para segunda maior empresa de transformação de tomate do mundo, com uma capacidade anual de transformação de 1,15 milhões de toneladas, o que representa 3,5% da quota mundial. É quase tanto como toda a produção nacional.É por isso que, apesar de o produto só chegar no verão, persiste na fábrica um agradável cheiro a tomate. A produção de concentrado está parada, mas as linhas de enchimento continuam a funcionar com produto do ano passado. Trabalham 24 horas por dia e com 200 pessoas. Em agosto e setembro são 600. Aqui, pelos vistos, há emprego, apesar de a cultura do tomate ser das mais duras e caras de fazer. Plantar um hectare custa 5500 euros, mas para ter vendas são precisos no mínimo 10 hectares, ou seja, 55 mil euros, diz o presidente da Associação Nacional dos Industriais de Tomate, Miguel Cambezes.Apesar dos custos e dos riscos, o negócio floresce e ganha escala. Aqui não há depressão nem recessão, ao contrário do que acontece no resto do país. No negócio do tomate vivem-se os melhores anos de sempre. A chuva não para de cair, é verdade, mas o sol brilha para os produtores de tomate.
O que é que o tomate português tem?O tomate português tem de ter alguma coisa de especial para que 95% do produto transformado seja procurado lá fora. "Sempre exportámos quase tudo. Há 20 anos, iam bidões de garagem para a União Soviética. Hoje, vendemos para o mundo inteiro", conta Miguel Cambezes. Porquê? Simples: "O nosso tomate tem a melhor cor, é vermelho-vivo, é brilhante, e isso é importante nos molhos. E depois tem um sabor mais frutado e doce do que ácido." Foi por isso que os japoneses compraram a FIT e a Italagro. "Usam-no para fazer sumo, molhos e até protetores solares bebíveis à base de licopeno, que é uma substância do tomate que previne o cancro", explica Martin Stilwell.
São as condições meteorológicas e geológicas que tornam o tomate português um dos melhores do mundo. "A maior parte da produção está no vale dos rios Sorraia e Tejo, perto do mar, e além da humidade temos solos arenosos e nunca temos nem muito frio nem muito calor", diz Miguel Cambezes. É por isso que o tomate é plantado em abril e maio e colhido entre finais de julho e meados de setembro. E é também por isso que a chuva toda que caiu em março atrasa o processo e coloca em risco a produção, porque assim que começar o calor o tomate já tem de estar crescido e não ainda a crescer. Em Santo Isidro, que pertence à Sugalidal, estão 50 milhões de plantas de tomate que já deviam estar cultivadas, conta a responsável, Isabel Almeida. É mais de metade da capacidade deste viveiro.Marcos Cabrito é engenheiro agrónomo nos viveiros PréPlanta, em Samora Correia, e também se queixa do mesmo. "Estamos a ficar com falta de espaço porque o tomate não sai, mas não o podemos pôr na rua e não o podemos deixar estragar até porque é muito caro." Quanto? Cada pacote de 100 mil sementes - que dá para uns três hectares - custa 600 euros.Cidalina Silva diz que só lá para maio é que se deve entrar nas terras e suspira. "Se não fossem os meus filhos, já não andava nesta vida." E o que ia fazer depois? "Talvez plantar milho, que dá menos trabalho." Mas Filipe e Cidalina têm hoje uma grande responsabilidade. Vendem parte da sua produção à Sugalidal. Eles e outros seis mil agricultores, além da produção própria da empresa. As duas fábricas, uma em Benavente e outra na Azambuja, transformam 550 mil toneladas de tomate por ano. Os concentrados vão para a Rússia, para o Japão e quem sabe para a Arábia Saudita, onde se bebe muito sumo de tomate. Já os molhos e as polpas da Guloso - a marca própria - ficam em Portugal e os vários tipos de molhos e ketchup da Heinz vão para o Norte da Europa.À frente da empresa, responsável pelo negócio internacional, está João Ortigão Costa, de 44 anos, também ele descendente de uma família de industriais de tomate. Era gestor hoteleiro e o amor à camisola ganhou-o depois de entrar no negócio, há 15 anos. "Na altura a Sugalidal faturava sete a oito milhões e hoje fatura 100 milhões só em Portugal. Só gostando é que se chega a estes números", diz. Com as unidades de Espanha e do Chile, a faturação vai chegar aos 200 milhões. Num ano, com a compra da unidade do Chile em 2012, a Sugalidal passou de 15.ª para segunda maior empresa de transformação de tomate do mundo, com uma capacidade anual de transformação de 1,15 milhões de toneladas, o que representa 3,5% da quota mundial. É quase tanto como toda a produção nacional.É por isso que, apesar de o produto só chegar no verão, persiste na fábrica um agradável cheiro a tomate. A produção de concentrado está parada, mas as linhas de enchimento continuam a funcionar com produto do ano passado. Trabalham 24 horas por dia e com 200 pessoas. Em agosto e setembro são 600. Aqui, pelos vistos, há emprego, apesar de a cultura do tomate ser das mais duras e caras de fazer. Plantar um hectare custa 5500 euros, mas para ter vendas são precisos no mínimo 10 hectares, ou seja, 55 mil euros, diz o presidente da Associação Nacional dos Industriais de Tomate, Miguel Cambezes.Apesar dos custos e dos riscos, o negócio floresce e ganha escala. Aqui não há depressão nem recessão, ao contrário do que acontece no resto do país. No negócio do tomate vivem-se os melhores anos de sempre. A chuva não para de cair, é verdade, mas o sol brilha para os produtores de tomate.
Em 20 anos, Portugal tornou-se um dos maiores produtores e exportadores de tomate do mundo. É a prova de que ainda se faz agricultura" FONTE: www.dinheirovivo.pt
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